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“Foi bom. A gente fez coisas que não fazia há anos, tipo almoçar”. Essa é uma das lembranças que um menino de 11 tem dos últimos dias ao lado da mãe. No domingo (12), ele surpreendeu um juiz de Joinville, no Norte de Santa Catarina, ao escrever um agradecimento enviado pela internet.

O magistrado havia concedido prisão domiciliar para que a mulher, que tinha aids e estava em estado terminal, pudesse morrer perto da família. (Leia a íntegra da carta ao fim da reportagem). Na mensagem, o menino conta que cresceu vendo os pais “fazendo coisa errada e sendo presos”. A mãe, reincidente por furto, havia sido detida novamente no início do ano passado.

Em entrevista ao RBS Notícias,  o menino disse sentir “bastante” falta da mãe, mas sonha com um futuro bem diferente da vida dos pais. “Quero trabalhar, ser médico”.

Em dezembro, depois de quase um ano sem vê-la, o menino foi visitar a mãe no hospital – ela sofria com complicações decorrentes da aids. “Não foi ruim, achei péssimo. Ela estava paralisada no lado esquerdo e acorrentada”, lembra o garoto

A avó paterna decidiu, então, procurar a ajuda do juiz de execuções penais de Joinville João Marcos Buch. Ela chegou de mãos dadas com o neto ao gabinete para fazer um pedido: que a mãe do menino tivesse o direito de morrer em casa, “com dignidade”.

Após visitar a presa no hospital, Buch concedeu o direito à prisão domiciliar. “A letra fria de um papel não transmite aquilo que o juiz vê com os próprios olhos. E eu verifiquei nitidamente que a situação dela era grave”, diz Buch.

No dia 25 de março, a mulher morreu num hospital de Florianópolis, após passar os últimos dias de vida na casa de uma irmã, ao lado dos filhos de 11 e 9 anos. Na mesma época o pai conseguiu liberdade condicional, lembra a avó paterna.

Natal com a mãe

“Hoje eles falam pra mim das lembranças boas”, conta a avó, que cuida das crianças em Joinville. “Falam do dia no shopping, dos fogos na Beira-mar, do Natal com a mãe. Não falam mais do dia em que ela foi presa”.

Ao G1, a avó também contou que o menino de 11 anos teve dedicação total à mãe. “Foram à praia, fizeram passeios. Ele dormia num colchão ao lado do sofá só pra cuidar dela, caso ela precisasse de alguma coisa. Deixou até de brincar para cuidar da mãe”, conta.

Leia a íntegra da carta enviada pelo menino ao juiz
Olá, senhor juiz. Minha avó disse que eu podia deixar um recado aqui, que o senhor ia ver. Tenho 11 anos e sou filho da … Sei que o senhor vai lembrar, sou neto da… e só queria agradecer ao senhor. Cresci vendo meus pais fazendo coisa errada e sendo presos. Por muitas vezes entrei na prisão para visitar meu pai ou minha mãe. Por muitas vezes vi eles ganharem a liberdade e novamente serem presos. Mas hoje esse é um passado que não faz mais parte do meu presente. Quis Deus que meu pai saísse da prisão em dezembro, de condicional e fosse trabalhar. Minha mãe, quis Deus que ela ficasse bem doente e o senhor foi lá soltar. Eu tava segurando a mão da minha vó quando ela foi na sua sala pedir para aquelas moças que alguém fizesse alguma coisa pra minha mãe morrer com dignidade e o senhor fez. Também sou soropositivo, essa escolha não fui eu quem fez, mas tenho direito às próximas. E desde já quero ser um homem honesto. Obrigado, senhor juiz João Marcos.