Desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, em 24 de fevereiro, busca-se um acordo de cessar-fogo entre as partes. A escalada do conflito, porém, afasta os países da possibilidade de assinar um tratado que agrade as duas partes.

As negociações estão paralisadas há semanas, com Moscou e Kiev sendo irredutíveis em suas demandas. O R7 entrevistou dois especialistas que apontam o que a Rússia e a Ucrânia buscam para alcançar o fim da guerra.

Rússia

Vladimir Putin não dá sinais de que pretende interromper ofensiva na Ucrânia

MIKHAIL METZEL/SPUTNIK/AFP – 25.5.2022

O historiador Rodrigo Ianhez, especialista em Rússia, afirma que é difícil determinar quais são as propostas russas na mesa de negociação com a Ucrânia.

“Um dos problemas de avaliar essa questão é que os próprios russos não têm sido muito claros em quais são seus objetivos. Quando havia negociação em andamento, eles haviam diminuído o escopo das condições”, conta Ianhez.

De acordo com o historiador, uma das principais demandas de Moscou é a manutenção do território da Crimeia, anexado em 2014, e o status de neutralidade ucraniano diante da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), além do reconhecimento da independência e separação de Donetsk e Lugansk, regiões da Ucrânia que são pró-rússia.

Com o avançar da guerra e o sucesso russo na ofensiva no leste da Ucrânia, a lista de objetivos da Rússia cresce com o domínio de mais territórios, como Kherson.

“Dificilmente [a Rússia] abriria mão dessas conquistas e de um corredor que conecte por terra até o território da própria Rússia”, disse Ianhez, se referindo à península da Crimeia.

“Para os russos, a situação na Crimeia, principalmente, é uma situação sem volta. Quer dizer, a Crimeia já está integrada à Federação Russa e a própria população da península seria contrária a um retorno à Ucrânia.”

Ucrânia

Apesar de exigir paz, Volodmir Zelenski não possui conduta conciliadora

FABRICE COFFRINI/AFP – 23.5.2022

O professor de relações internacionais da ESPM Vitor Alessandri Ribeiro afirma que a principal demanda de Kiev é a restauração integral do território ao que era antes do início da invasão, algo que a Rússia não concorda. O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, também deseja negociar diretamente com o líder russo Vladimir Putin.

“Zelenski exige que a coversa para a paz ocorra diretamente entre ele e Vladimir Putin, recusando-se a tratar com emissários do governo russo”, afirma Ribeiro em entrevista ao R7.

Para o professor de relações internacionais, alguns movimentos do presidente ucraniano são contraditórios, já que os pedidos de paz são sucedidos por ações que escalam a guerra.

“Zelenski tem evidenciado uma combinação de gestos contraditórios, com acenos favoráveis à paz, mas mantendo uma postura de confronto. Evidencia sentir o impacto das mortes e da destruição do país dizendo ser hora de buscar a paz, mas sem, no entanto, adotar uma linguagem que admita derrota.”

O que é plausível para o cessar-fogo?

Bandeiras da Ucrânia e da Rússia em uma mesa antes de negociações entre os dois países

Bandeiras da Ucrânia e da Rússia em uma mesa antes de negociações entre os dois países

REUTERS – 28.02.2022

Tanto Ribeiro quanto Ianhez concordam que os avanços russos no campo de batalha enfraquecem o poder de Kiev na mesa de negociações. Apesar da lentidão, a ofensiva de Moscou no leste da Ucrânia tem sido favorável às tropas de Putin.

“Os russos, nas últimas semanas, vêm fazendo avanços lentos, mas constantes nas regiões separatistas. Nessas condições, os próprios russos falaram que com essa exigência [de devolver territórios], apenas para sentar à mesa, não há sequer condições das conversas serem retomadas”, comenta Ianhez.

“Se é verdade que as tropas russas falharam em tomar a capital Kiev, não é menos verdade que mudaram a estratégia militar focando no leste e que agora a situação militar é mais favorável aos russos”, declara Ribeiro. “A dificuldade para os ucranianos terem suas condições aceitas agora está no sucessos russo em campo militar”.

A retórica dos governos dos dois países assegura que as premissas de cada lado para a retomada das negociações são plausíveis, impossibilitando que eles retomem as conversas em um futuro próximo.

“Se a Rússia adentrar negociações de paz em tal condição, dificilmente irá concordar em reverter sua tomada desses territórios ucranianos. Nenhum dos lados dá mostras de aceitar ceder ao outro e isso apresenta um cenário muito provável de que o conflito ainda se estenda por bastante tempo”, diz o professor da ESPM.

“Já faz oito anos que [Donetsk e Lugansk] declaram independência, e se lançaram em uma guerra civil. As condições russas são plausíveis na visão de Moscou, por mais que Zelenski tenha colocado como inaceitáveis para os ucranianos”, conclui Ianhez.